quinta-feira, 26 de maio de 2016

Manda Nudes e a Geração das Relações de Copinho Descartável

Por Valquíria Vita
valquiria@txtconteudo.com.br






Essa semana li um texto chamado “A geração que trata tudo como descartável”, em que a Ruth Manus, do Estadão, comenta como as relações de hoje são tão frágeis (e descartáveis) como um copinho plástico daqueles que usamos para tomar cafezinho na saída do restaurante.
Na primeira vez que li, o texto me incomodou. Incomodou tanto a ponto de me fazer pensar “Não, ela está exagerando. É só mais um daqueles textos batidos que criticam a geração Y, que quer ter tudo mas que não tem nada”, todo aquele blablabla que vocês já conhecem. Mas lendo de novo alguns dias depois, e somado a alguns acontecimentos recentes, o texto começou a bater — igual àquela Skol Beats que você, no início, acha fraquinha, mas que, pouco tempo depois, percebe que está fazendo a sala girar.
Bom, minha sala girou. Girou quando voltei a pensar sério nessa superficialidade dos relacionamentos atuais. Os relacionamentos mantidos por mensagem de Whatsapp, de Messenger, de Snaps, de Happn. Os relacionamentos de “manda nudes”, ao invés do “nudes ao vivo”. O relacionamento que não precisa de compromisso algum, que não exige nada, que não cobra nada. “A gente se vê quando der”, “quando sobrar tempo”, “mas por enquanto… quem sabe tu vai mandando um nude aí para eu dormir bem?”.
Como bem definiu uma amiga minha: “é toda uma nova forma de se relacionar, em que temos a companhia virtualmente, mas não temos o stress do crescimento das relações”. E como é mais fácil, né? Ficar embaixo da coberta mandando mensagem, ao invés de assumir o esforço que uma relação olho no olho exige.
Gosto muito de discutir essa superficialidade com minhas amigas — também costumo compartilhar com a minha mãe, mas ela (felizmente!), acha difícil de compreender. E não compreende porque ela veio de uma geração, como ela mesmo diz, que “fazia questão de se encontrar sempre”, que “ia na reunião dançante” só porque queria ver a pessoa ao vivo.
As minhas amigas, da minha geração, convivem com essa descartabilidade, porque “compreender” talvez não seja a palavra exata para esse caso. E não é por falta de exemplos: o cara que insistia em pedir “manda nudes” mas tinha preguiça para promover encontros reais; o cara sentado na minha frente no ônibus que ia a Porto Alegre, que passou a viagem inteira mandando Whats para uma lista tão grande de meninas que eu não consegui nem contar (desculpa, eu sei que não deveria olhar o celular dos outros, mas ele estava na minha frente, gente); o outro, que cancelou o casamento na semana anterior, com a mesma facilidade com que eu cancelaria a manicure; ou aquele que fez o mesmo com o noivado de quatro anos: fim, partiu para outra, simples assim, manda vir a próxima.
É improvável que um dia a gente considere essas situações como algo normal. Assim como é improvável que achemos ok, quando o cara, que esqueceu do horário marcado, manda mensagem as 11 e meia da noite dizendo “tô indo te buscar”. Ou quando o ex-namorado volta a entrar em contato, como se tudo estivesse bem, sem pedido de desculpas, já que, segundo ele, “passado é passado, bola para frente”. E isso não é só com as mulheres, importante ressaltar. Um amigo sentiu-se exatamente assim quando reservou a casa na praia para passar uma semana com o namorado e ouviu: “Ah, mas não reserva ainda! Vai que a gente brigue até lá!”. Lógico que essa viagem, depois disso, não saiu. (Vale ressaltar também que o problema não existe apenas nos relacionamentos amorosos. Vemos muito nas amizades também. Como é fácil excluir, bloquear, esquecer, ao invés de lidar pessoalmente com um desentendimento.)
Talvez nunca aconteça de a gente aceitar o destino do copinho plástico de café. E acho que esse destino não tem que ser aceito mesmo. Porque a vida pode — e precisa — ser muito mais do que isso.


Texto original publicado na Level Cult: 
http://levelcult.com.br/manda-nudes-e-a-geracao-das-relacoes-de-copinho-descartavel/

Pressões Desnecessárias



Parem, apenas parem

Por Valquíria Vita
valquiria@txtconteudo.com.br

No dia primeiro, vou completar 29 anos. Confesso que aos 10 anos de idade, eu imaginava que com essa idade eu e meu marido lindo já estaríamos tendo o nosso terceiro bebê. Bom, não rolou ainda — nem o marido. Mas rolaram muitos namorados e muitas viagens, e estou ok com isso. Fiz as pazes com minhas experiências da última década, muito diferentes (e mais divertidas) das planejadas precocemente, na época em que eu tinha franja e aparelho nos dentes.
O problema é que as pessoas do meu convívio não fizeram as pazes com essa mudança de rumo. E a proximidade (ressalto, “proximidade”, e não “chegada”) aos 30, estão fazendo com que as pessoas me cobrem coisas incabíveis. Se você é mulher, sabe de que cobrança estamos falando aqui. E eu quase não queria ter que escrever sobre ela em pleno ano 2016, porque é um assunto assim, tão… 1950. Chega a me dar uma dorzinha ter que fazer um texto sobre isso. Mas aí vai:
“Quando é que tu vai ter um bebê?”
Não consigo atravessar uma semana sem ouvir essa pergunta. Sempre que a escuto, adoto a cara de pastel — aquela cara tosca que faz você dar um sorrisinho forçado sem mostrar os dentes. E, depois disso, eu acabo ficando na bad e me pego pensando na falta de noção da pergunta, principalmente quando feita a uma pessoa solteira. Além do fato de que essa criança cresceria sem um pai (kind of a big deal), ela também cresceria com uma mãe que ainda não está com tempo (nem condições psicológicas) para assistir Discovery Kids 12 horas por dia (e não me diga que não é isso o que acontece quando você é mãe, porque eu convivo com várias mães e é isso aí, sim).
Por isso, venho através desse texto fazer somente um pedido sobre essa pressão desnecessária. Parem, apenas parem.
Após uma breve pesquisa de campo (leia-se, olhei para o lado e consultei meu sócio), concluí que essa pressão não ocorre apenas com os solteiros (RÁ!). Os casados sem filhos são cobrados disso a toda hora, desde os cumprimentos pelo casamento. E o pior: quando têm um bebê, eles respiram aliviados acreditando estarem livres dessa pressão da sociedade, e é justamente aí que mora o perigo, porque uma pergunta ainda mais tensa começa a ser feita: “E quando vão ter outro filho?”
Essa semana, uma de minhas entrevistadas me disse que a filosofia dela era simples: “Viva e deixe os outros viverem”. Quando ela falou isso, eu tive vontade de levantar e dar um abraço nela. Porque é nisso que eu acredito totalmente.
Se você quis ter filhos jovem, que bom, ótimo para você! Se não, não cabe a ninguém o direito de te cobrar por isso. Se você quer casar, legal. Se só quer ir morar junto com o seu namorado (ou sua namorada, ou com os dois!), super ok também. Se quiser fazer dieta, faça. Se não quiser, tudo bem, abrace suas gordurinhas e seja feliz. Gosta de malhar? Parabéns! Não gosta? Não tem problema. Gosta de fumar? Fuma aí e não deixa ninguém encher o teu saco por causa isso.
Essa loucura de “tem que casar”, “tem que ter filho”, “tem que correr 5km às 6h da manhã”, “tem que ser saudável e magro”, “tem que sair no sábado à noite”, “tem que ganhar bem” e tantos outros “tem que” causa uma fadiga muito desnecessária — e uma sensação de que por mais que você esteja fazendo o que os outros esperam que você faça, você nunca está fazendo o suficiente.
Como já bem diria meu pai “tem que nada; tem que morrer, e só!”
Viva como você quiser viver e deixe os outros fazerem o mesmo. É tão curta a vida para a gente tentar ficar vivendo conforme as expectativas das outras pessoas…
Cada um tem que saber lidar com as consequências das suas escolhas — porque nós sabemos que elas vêm, elas sempre vêm. Mas o importante aqui, mais do que as consequências, é ter a certeza de que essas escolhas estão sendo suas. E somente suas.





Texto original publicado no blog da Level Cult: 

terça-feira, 24 de maio de 2016

LADO B: Francisco Ferrer

A grandiosidade do simples é o conceito que norteia a vida do superintendente do Hospital Pompéia


Por Valquíria Vita

valquiria@txtconteudo.com.br



Há um ditado em Inglês que diz “Hard work always pays off” — O trabalho duro sempre compensa. Este ditado deve ser o mais adequado para definir a trajetória de Francisco Ferrer, 57 anos, superintendente do Hospital Pompéia.
Ferrer pode dizer, literalmente, que morou no hospital ao assumir o emprego, em 1989. Por vontade (e ideia) própria, ele se mudou para a suíte do quarto 301, próximo à ala da maternidade. “Eu queria entender a dinâmica do hospital. E eu vivi o Pompéia inteiramente”, conta Ferrer, que dormiu sozinho e fez as refeições no hospital durante três meses.
Na época, a mulher, Rosângela, e o filho, Francisco, permaneceram em Novo Hamburgo até que Ferrer se estabelecesse em Caxias do Sul com o novo emprego, de gestor do hospital — o que, nem de longe, era um emprego simples.
O Pompéia, no final daquela década, passava por sua pior crise, com um endividamento que chegava a seis vezes o faturamento. Não é qualquer um que toparia assumir uma empreitada dessas. Assim como não é todo mundo que moraria dentro do ambiente de trabalho para poder compreendê-lo melhor. As duas atitudes, portanto, nos dizem muito sobre Francisco Ferrer. Um homem extremamente motivado por desafios — e fã do trabalho duro.
Desde aquele verão em que Ferrer mudou-se para Caxias, já se passaram 27 anos. O Pompéia saiu do endividamento e hoje é referência na região, com um quadro de mais de mil funcionários. “Lembro de uma noite, quando recém havia me mudado, de pegar a Júlio de Castilhos, sentir aquele arzinho de verão, e pensar: ‘Poxa, isso é uma cidade de trabalho, em que a gente vê que as pessoas realmente trabalham. Esta é a cidade que dá para encarar para viver. E eu trouxe aquilo comigo. Assim como o hospital”, conta Ferrer, sentado na sala de reuniões da superintendência do Pompéia, no nono andar do hospital.


O líder do campinho da Rua Tristão Pinto

Um bom gestor, além de não se intimidar pelos desafios, deve ter boas capacidades organizacionais e saber reunir e motivar pessoas. Ferrer já tinha algumas dessas habilidades quando ainda era um guri, em São Gabriel, sua cidade natal. Foi lá, na cidadezinha de 60 mil habitantes da fronteira Oeste do Estado, que ele começou a exercer sua liderança. Ferrer era o líder do campinho de futebol que ficava no pátio na casa dele. Além de organizar os jogos que ocorriam todas as tardes com os outros meninos da Rua Coronel Tristão Pinto, Ferrer também recrutava jogadores em outros bairros para os campeonatos. “Tive uma infância maravilhosa”, diz.
O grupo de amigos também teve a infância marcada pela diversão dos carnavais. O Bloco Mirim da Rua Tristão Pinto foi tradição durante muitos anos. Com baterias feitas com latas de biscoito e fantasias costuradas pelas mães, as crianças desfilavam pela rua, que era fechada pela prefeitura durante aqueles dias só para isso. “O pessoal de São Gabriel vinha assistir e nós passávamos com ‘Ei, você aí, me dá um dinheiro aí’. E aquele dinheiro depois era para uma festa que a gente organizava no pátio lá de casa, com bolo e ki-suco”, lembra Ferrer.
Filho de Francisco Marciano Ferrer e de Diema Soares Ferrer, ele teve três irmãs: Marisa, Rosana e Miriam. “Na época, mesmo havendo cuidado para que a educação fosse separada, tivemos uma convivência extremamente fraterna”.
A convivência com as irmãs e os amigos de infância continuou durante a adolescência, quando Ferrer começou a frequentar as hoje nostálgicas reuniões dançantes de garagem, embaladas com músicas do toca-disco. Nos finais de semana, o lazer eram as pescarias e acampamentos à beira dos açudes das fazendas de São Gabriel.
Após um período no exército, ele deixou São Gabriel aos 19 anos, para mudar-se para Santa Maria, onde cursou Farmácia e Bioquímica na universidade federal. Formou-se em 1982, como Técnico em Análises Clínicas. Depois dessa primeira formatura, mal sabia ele que ainda viriam mais algumas graduações.

Novos desafios e um acidente de carro
A primeira experiência de trabalho de Ferrer foi durante a faculdade, como monitor

em uma disciplina de farmácia hospitalar. “Ali, tive a primeira aproximação com o hospital”, conta. Em Santa Maria, ele também teve a primeira aproximação com o serviço social, ao integrar um projeto chamado Banco da Esperança, que prestava assistência de saúde nos bairros. “Sempre senti a necessidade de, como profissional, também enxergar esse lado social.”
Após a formatura, Ferrer voltou para a cidade natal, onde não só se tornou o responsável técnico por duas farmácias da cidade, como assumiu a cadeira de análises qúmicas na faculdade.
Ferrer tinha conhecido Rosângela alguns anos antes, no Ginásio, mas, naquela época, namorou uma amiga dela. Depois da formatura, porém, voltou a encontrar Rosângela por acaso, dentro de sua própria casa. “Ela foi visitar minha irmã, Marisa, e nós nos reconhecemos e começamos a conversar”, conta Ferrer. Os dois engarataram um namoro e se casaram, em 1985.
Na mesma época, Ferrer começava a assumir grandes desafios. A convite do prefeito, passou a administrar a Santa Casa de São Gabriel, enquanto cursava uma especialização em administração hospitalar. “Na Santa Casa, foram quatro anos de um aprendizado fantástico”, diz Ferrer. Grande parte deste aprendizado se deu justamente porque o hospital foi totalmente renovado e superou todas as graves dificuldades em que se encontrava antes de ele assumir.
Por causa do bom trabalho desenvolvido lá, Ferrer foi convidado pela Sociedade Beneficente São Camilo para integrar o escritório em Novo Hamburgo que administraria 18 hospitais filantrópicos no Estado.
Ele e Rosângela, que já tinham o filho mais velho, mudaram-se para Novo Hamburgo. Mas Ferrer passava mais tempo dentro na estrada do que em casa, já que prestava consultoria para os dirigentes hospitalares da região. Tantas viagens, no entanto, acabaram resultando em um acidente de carro, em que Ferrer fraturou o braço e teve uma lesão em um nervo que o impediu de mover a mão direita por diversos meses. “Sou canhoto, graças a Deus”, conta.
Foi com o braço direito engessado que ele veio a Caxias no final dos anos 80, quando assumiu o maior desafio de sua carreira: administrar o Pompéia. Após aquele período inicial de três meses vivendo no hospital, Ferrer decidiu que era aqui mesmo, em Caxias, que ficaria. Rosângela e o filho Francisco também mudaram-se para a cidade onde, anos depois, nasceu a segunda filha do casal, Maria Eduarda. A caçula veio ao mundo em parto realizado no Pompéia.

Determinação, capacitação e vontade

Mesmo que a função exija algumas características similares, a rotina de administrar um hospital é diferente da de administrar uma empresa. “Para a gestão hospitalar, é preciso ter entendimento que quando tratamos de saúde, as coisas não são definitivas. Todas as decisões têm como princípio fundamental a vida, não dá para discutir se podemos tirar um equipamento, porque não é uma indústria, é algo que trata com a vida. Custe o que custar, o objetivo é a vida”, explica o superintendente.
Além da sensibilidade para lidar com os problemas, Ferrer elenca outros tópicos importantes para o sucesso e realização: “Primeiro a determinação, sem isso, você não avança; depois vem a capacitação; e, além disso, o gostar do que se faz, que é essencial para tudo aquilo que envolve a nossa vida”.
Ferrer sempre colocou em prática essa determinação, aliada ao constante conhecimento técnico. Depois do curso de Farmácia, estudou Direito e iniciou Ciências Políticas. Pensando na aposentadoria, fez uma graduação em Tecnólogo em Negócios Imobiliários, atividade que cogita para o futuro. Além disso, hoje também cursa Economia à distância. “Tudo isso acresce à capacidade de resposta na gestão hospitalar”, justifica.


A grandiosidade do simples

Quando não está no hospital e quando está liberado das atividades da faculdade de Economia, Ferrer ocupa seu tempo com três dos seus lazeres favoritos: assistir à Globo News à noite, conferir os lançamentos do cinema ou então jantar fora com a família. “Amo sair para comer um bom prato. Churrasco, filé… sou muito carnívoro por causa da minha região. Mas aqui, também passei a apreciar galeto e sopa de capeletti.”
Nas férias, a família gosta de viajar. Já foram à Europa, onde visitaram a Espanha, terra dos antepassados de Ferrer, e à Itália, de onde veio a família de Rosângela. Eles veraneiam em Capão da Canoa, praia que escolheram para comprar um apartamento justamente por ser onde grande parte dos amigos de infância de São Gabriel também passam o verão. “A família é o maior tesouro que a gente tem”, diz Ferrer, ao falar das férias com os filhos e a mulher.
Ele tenta passar aos dois filhos, já formados, os mesmos valiosos ensinamentos que recebeu dos pais. “Com minha mãe, aprendi a serenidade, com o meu pai, a honestidade.” Ferrer era muito próximo dos pais, e diz que o falecimento deles (a mãe, quando ele tinha apenas 26 anos, e o pai, há oito anos) foram os momentos mais difíceis de sua vida. “Por mais que vivenciemos as perdas, nunca estamos preparados para elas. E não se tem idade para se sentir órfão quando existe uma relação de tanta admiração.”
Uma outra referência de Ferrer, além dos pais, é o pacifista Gandhi: “Gandhi disse: ‘Aprenda como se fosse viver para sempre. Viva como se fosse morrer amanhã’. E eu acho essa frase fantástica. Porque a vida é um constante aprendizado, é saber viver”, diz, resumindo a sua vida de uma maneira simples e tocante: “Minha vida é o trabalho e é a família. A grandiosidade do simples. O resto é ter fé e tocar para frente”. 

Perfil publicado na Revista Acontece, de Caxias do Sul, em Maio de 2016.

sexta-feira, 6 de maio de 2016

"Manda nudes" e a geração das relações de copinho descartável

"Manda nudes" e a geração das relações de copinho descartável

Essa semana li um texto chamado “A geração que trata tudo como descartável”, em que a Ruth Manus, do Estadão, comenta como as relações de hoje são tão frágeis (e descartáveis) como um copinho plástico daqueles que usamos para tomar cafezinho na saída do restaurante.

Na primeira vez que li, o texto me incomodou. Incomodou tanto a ponto de me fazer pensar “Não, ela está exagerando. É só mais um daqueles textos batidos que criticam a geração Y, que quer ter tudo mas que não tem nada”, todo aquele blablabla que vocês já conhecem. Mas lendo de novo alguns dias depois, e somado a alguns acontecimentos recentes, o texto começou a bater — igual àquela Skol Beats que você, no início, acha fraquinha, mas que, pouco tempo depois, percebe que está fazendo a sala girar.

Bom, minha sala girou. Girou quando voltei a pensar sério nessa superficialidade dos relacionamentos atuais. Os relacionamentos mantidos por mensagem de Whatsapp, de Messenger, de Snaps, de Happn. Os relacionamentos de “manda nudes”, ao invés do “nudes ao vivo”. O relacionamento que não precisa de compromisso algum, que não exige nada, que não cobra nada. “A gente se vê quando der”, “quando sobrar tempo”, “mas por enquanto… quem sabe tu vai mandando um nude aí para eu dormir bem?”.

Como bem definiu uma amiga minha: “é toda uma nova forma de se relacionar, em que temos a companhia virtualmente, mas não temos o stress do crescimento das relações”. E como é mais fácil, né? Ficar embaixo da coberta mandando mensagem, ao invés de assumir o esforço que uma relação olho no olho exige. 

Gosto muito de discutir essa superficialidade com minhas amigas — também costumo compartilhar com a minha mãe, mas ela (felizmente!), acha difícil de compreender. E não compreende porque ela veio de uma geração, como ela mesmo diz, que “fazia questão de se encontrar sempre”, que “ia na reunião dançante” só porque queria ver a pessoa. Ao vivo.

As minhas amigas, da minha geração, convivem com essa descartabilidade, porque "compreender" talvez não seja a palavra exata para esse caso. E não é por falta de exemplos: 

o cara que insistia em pedir "manda nudes" mas tinha preguiça para promover encontros reais; 
o cara sentado na minha frente no ônibus que ia a Porto Alegre, que passou a viagem inteira mandando Whats para uma lista tão grande de meninas que eu não consegui nem contar (desculpa, eu sei que não deveria olhar o celular dos outros, mas ele estava na minha frente, gente); 
o outro, que cancelou o casamento na semana anterior, com a mesma facilidade com que eu cancelaria a manicure; 
ou aquele que fez o mesmo com o noivado de quatro anos: fim, partiu para outra, simples assim, manda vir a próxima.

É improvável que um dia a gente considere essas situações como algo normal. Assim como é improvável que achemos ok, quando o cara, que esqueceu do horário marcado, manda mensagem as 11 e meia da noite dizendo "tô indo te buscar". Ou quando o ex-namorado volta a entrar em contato, como se tudo estivesse bem, sem pedido de desculpas, já que, segundo ele, “passado é passado, bola para frente”. Percebem como é tudo num ritmo super acelerado? 

E isso não é só com as mulheres, importante ressaltar. Um amigo sentiu-se exatamente assim quando reservou a casa na praia para passar uma semana com o namorado e ouviu: “Ah, mas não reserva ainda! Vai que a gente brigue até lá!”. Lógico que essa viagem, depois disso, não saiu. 

Vale ressaltar também que o problema não existe apenas nos relacionamentos amorosos. Vemos muito nas amizades também. Como é fácil excluir, bloquear, esquecer, ao invés de lidar pessoalmente com um desentendimento.

Talvez nunca aconteça de a gente aceitar o destino do copinho plástico de café. E acho que esse destino não tem que ser aceito mesmo. Porque a vida pode — e precisa — ser muito mais do que isso.