sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Lado B - Jayme Paviani



          Escrever perfis é uma das paixões da minha vida. É na verdade o que me sobrou de paixão do jornalismo - paixão essa que era bem mais forte há um tempo. Sigo empolgada para escrever sobre a vida das pessoas (tanto em Pittsburg quanto em Caxias), e, como sempre quis ser escritora, pretendo levar isso adiante agora que entrei no mestrado. No futuro, espero publicar biografias. 
          Por enquanto, publico aqui uma série de perfis que deixei pronta para a Revista Acontece, aqui de Caxias. O desse mês é do professor Jayme Paviani. Nos próximos meses, publico o de um fotógrafo que já clicou mais de 600 casamentos e o de uma voluntária de um asilo que trabalha de graça há 25 anos. Prometo que são pessoas sensacionais e que não irão se arrepender dessas leituras :)





perfil publicado na Revista Acontece, de Caxias do Sul, em fevereiro de 2014. 

Por Valquíria Vita
Autor de mais de 40 livros e professor da UCS por quase cinco décadas, Paviani nutre uma paixão inesgotável por filosofia e pela arte de ensinar. Por trás do escritor, filósofo e professor envolvido em inúmeros projetos de pesquisas e livros, está um avô orgulhoso, que é também apreciador de boa música, futebol, romances policiais e gatos



Na saída de uma aula no bloco E da Universidade de Caxias do Sul, numa tarde do final de novembro, um dos alunos apressa o passo para alcançar o professor Jayme Paviani. Tímido, lhe entrega um presente e uma frase quase ensaiada: "Em agradecimento aos encontros semanais das nossas aulas nesse semestre", diz, acrescentando ao apontar para o presente: "Sei que o senhor gosta e tem até um poema sobre isso". O professor, igualmente tímido, recebe o presente (uma garrafa de vinho) e responde com um obrigado, um sorriso e um aperto de mão, e segue para sua sala. Paviani não é daqueles escritores que gostam de receber muitos elogios – do que quer que sejam – apesar de ter um currículo que se destaca na academia: publicou mais de 40 livros e tem 48 anos de experiência em sala de aula, onde orientou mais de 60 teses de mestrado e doutorado.
O interessante é que quem escuta o nome do professor do mestrado em Educação da UCS rapidamente o relaciona à filosofia – tema central de seus estudos desde que era um jovem aluno do seminário. O lado que poucas pessoas conhecem é que o escritor e professor é também um avô muito coruja, que consegue manejar o tempo que dedica a estudar e ensinar Platão aos universitários, com as horas que passa com os dois netos pequenos, Enzo, de cinco anos, e Martina, de 10, que vivem na casa ao lado da dele.
Uma foto das duas crianças abraçadas e sorrindo está emoldurada em uma das mesas da sala de pesquisa de Paviani, na UCS, para que ele possa olhar para elas todos os dias – até mesmo nos mais apressados, como naquela terça-feira em que concedeu essa entrevista, onde teve de encontrar tempo entre uma aula e uma palestra que ministraria na UCS uma hora mais tarde. Naquela tarde, ele estava sozinho na sala – a outra professora que ocupa o espaço de pesquisa e tem seu nome exposto na porta junto com o dele é sua esposa, a professora do mestrado em Educação da UCS, Neires Soldatelli Paviani.
Foi no espaço acadêmico, que os dois dividem até hoje, que Jayme e Neires se conheceram, há 48 anos. O que levou Paviani a ingressar no ambiente da universidade foi sua formação inicial. Tudo começou em Flores da Cunha, onde o escritor nasceu, em 4 de junho de 1940. Filho de Esmeraldina e Raymundo, Paviani não quis seguir os passos do pai, famoso no meio político da região – Raymundo foi vereador e prefeito de Flores da Cunha. "Já recebi várias propostas, mas nunca me envolvi com política", diz ele.
Ainda jovem, Paviani veio estudar no seminário em Caxias do Sul. "Desde os 11 sou caxiense", diz o escritor, que recebeu o título de Cidadão Caxiense em 1999. Foi no ambiente do seminário onde Paviani ainda jovem teve os primeiros contatos com assuntos como latim e filosofia. "Foi aí que eu comecei a escrever poemas. Naquelas manhãs lindas de outono eu lia poesias de Horácio e Virgílio. Descobri a poesia e nunca mais abandonei", conta. O seu primeiro livro de poemas, Matrícula, escrito em conjunto com outros autores, foi lançado em 1967. Hoje, o autor já coleciona oito livros próprios de poemas.
A escolha pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, na época oferecida em Viamão (que depois se tornou Universidade de Caxias do Sul), veio naturalmente depois do seminário. Após a graduação em Filosofia, Paviani estava apto para começar a lecionar, exercício que iniciou em março de 1965. Ao mesmo tempo, ele ingressou em uma segunda graduação, dessa vez em Direito. Alguns anos mais tarde, em 1972, foi um dos primeiros professores da UCS a ingressar no mestrado – na época, como ainda não existia em Filosofia, ele optou pelo mestrado em Educação. "Foram as contingências que me levaram a todos esses caminhos", diz. Depois do mestrado, ele fez doutorado em Letras e concluiu um pós doutorado em Pádova na Itália, onde especializou-se em Filosofia Grega.
Por causa da formação em quatro áreas diferentes (Filosofia, Direito, Educação e Letras) Paviani faz questão de ressaltar a interdiscilinaridade de seu trabalho. "Eu sempre lecionei filosofia para diversos outros cursos. A filosofia que eu estudo é voltada para outras áreas do conhecimento", explica.

O professor já perdeu as contas de quantas conferências já participou em outras universidades. Só no último semestre de 2013 já havia recebido convite para 20. Optou por participar de "apenas" dez. De todas as que já palestrou, lembra especialmente de uma em Nova Iorque, em 2000, onde falou sobre globalização para 2 mil pessoas – o tamanho do público não o intimidou, diz ele. "Fico mais nervoso para falar para 5, 6 pessoas", conta ele, que, na época, palestrou em italiano – Paviani também entende inglês, espanhol e francês.
Ao longo da trajetória, foram muitos os convites para dar aulas em universidades em outras cidades – fora os 19 anos que coordenou mestrado e doutorado em Filosofia da PUC/RS, em Porto Alegre (mas que manteve os laços em Caxias), Paviani nunca aceitou nenhum outro convite para sair da cidade que o acolheu desde os 11 anos de idade. "Quando eu era ainda jovem, li uma frase que nunca mais saiu da minha cabeça: ‘A pessoa realmente vence na vida, quando ela vence na própria terra’".
Neires, sua esposa, também nunca aceitou convites para sair de Caxias. Os dois se conheceram em 1965, na Faculdade de Filosofia, quando Paviani era professor de Filosofia e Neires, aluna do curso de Letras. Casaram-se três anos depois e tiveram dois filhos: Leonardo Soldatelli Paviani, que hoje é dentista e violinista da Orquestra Sinfônica da UCS, e Monica Soldatelli Paviani, que é psiquiatra.
Hoje, além de ser professor e estar envolvido em projetos de pesquisa do mestrado de Filosofia e de Educação na UCS, Paviani dedica seu tempo para concluir alguns livros, escrever para o jornal Pioneiro e para a revista Bom Vivant, contribuir para obras de outros autores e participar de palestras e conferências. Quando sobra um tempo – o que é raro – ele diz que cultiva três hobbies. O primeiro deles é acompanhar futebol – apenas acompanhar e não torcer, como ele mesmo explica. Paviani faz questão de assistir os jogos de Juventude e Inter, mas também não perde as partidas do Grêmio, time do coração do neto, Enzo. O segundo hobbie é ouvir música – e ele diz ser muito eclético, ouvindo desde sertaneja até erudita. "Desde que seja música boa. Apreciar música é uma coisa genial". O último hobbie envolve leitura – mas não as científicas e filosóficas, que já essas fazem parte de sua rotina. Paviani é fã de romances policiais, e diz ler até dez títulos por ano. "Só não leio mais porque não dá tempo", justifica. Os romances enchem parte das prateleiras da biblioteca de sua casa, que conta com mais de 7 mil obras.
Uma das frequentadoras assíduas da biblioteca, como ele mesmo brinca, era Greta, uma gata siamesa que faleceu há pouco tempo. Paviani e a mulher gostam tanto de gatos que já chegaram a ter mais de 10 felinos em casa de uma vez só. Com a morte de Greta, a casa hoje é ocupada por dois cachorros, um deles, recolhido da rua e acolhido pelo casal. Os dois não pensam em adotar novos gatos, já que com a rotina agitada de ambos, falta tempo para cuidar de tantos animais.
Aos 73 anos, Paviani diz que ainda não está pronto para descansar. Esse ano, ele já lançou o livro As Origens da Estética em Platão e até o final de 2013 pretende lançar mais um. Intitulado "Uma introdução à Fisolofia", a obra, apesar do título, é "um livro que só se escreve na maturidade," como explica ele. O professor também está trabalhando em mais dois livros de poemas. "Mas não tenho pressa de terminá-los. Poema é a coisa mais difícil de ser feita. O poema tem que ser bom mesmo, e não mais ou menos".
Ele diz que pretende continuar fazendo o que mais gosta: dar aulas. A atividade, segundo ele, o relaxa, já que o ambiente da universidade é rejuvenescedor. A explicação para isso, diz ele, está nos alunos – na sua maioria, jovens como aquele que no início dessa matéria lhe entregou uma garrafa de vinho em agradecimento às ótimas aulas de filosofia. A convivência com eles talvez seja exatamente a receita para a disposição do incansável Jayme Paviani: "Costumo dizer que um dos segredos da universidade é que os prédios envelhecem, os professores envelhecem, mas os alunos sempre têm 20 anos".

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

A carta que a gente nunca mais abriu

Em 2010 eu e quatro amigos resolvemos escrever uma carta juntos. Na verdade, éramos em dois casais e um amigo. Combinamos de abrir a carta em janeiro de 2011, um ano depois, todos juntos, frase inclusive que foi escrita no envelope selado em que guardamos a carta. 

Nela, cada um dizia o que esperava pro futuro, tipo resoluções - na época, todos ainda na universidade devem ter desejado algo relacionado às futuras carreiras, não lembro, e não posso abrir a carta sozinha para relembrar para não descumprir o combinado 'todos juntos'. Hoje, acho que se fossemos escrever a mesma carta já desejaríamos coisas diferentes - eu sei que eu, pelo menos, faria isso. 

A carta ainda não foi aberta. Está guardada desde 2010 no fundo de uma gaveta do meu quarto de Caxias (pelo menos alguma coisa permaneceu no mesmo lugar, já que eu, por outro lado, saí de Caxias para morar em cinco casas diferentes do Kansas, depois em Porto Alegre e depois de volta pra Caxias - cansei só de lembrar).

Mas então. Depois daquele verão em Arroio do Sal em que escrevemos a carta naquela noite, nunca mais tivemos outra chance para reunir os cinco novamente. Os dois casais se separaram. Hoje, nenhum dos quatro, aliás, mora na mesma cidade do ex, e isso dificultou bastante. 

Muita coisa acabou acontecendo com todo mundo (e deus sabe quanta coisa cabe nesse 'muita') e impediu que a tal da carta fosse aberta.

Ontem, quando um desses amigos estava aqui em casa e acabou enxergando o envelope, ele lembrou que 'vamos ter que abrir essa carta agora só em 2015', porque ele sabe que não vou estar nos próximos anos. 

Mais uma vez, a leitura dela foi adiada. Mais uma vez, adiada pelos acontecimentos que ninguém previa. E quem sabe se, mesmo em 2015, isso vai ser possível?

Fiquei pensando em como todos os eventos das nossas vidas conseguem distanciar pessoas que eram muito próximas (e, ao mesmo tempo, unir outras ainda mais). 

Em como o surgimento de um problema realmente sério pode reforçar o sentido das amizades. 

E em como não podemos nunca contar com 'o ano que vem', nem o mês que vem e nem mesmo com o dia seguinte. A imprevisibilidade da vida não nos permite fazer isso. (Pena que leva um tempo até a gente perceber isso). 

E, bom, quanto à carta, talvez um dia ela seja aberta. Quem sabe, né?

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Pra quem não acredita mais em saudade

                                    


     Se você já morou fora (e voltou pro mesmo lugar) talvez você consiga compreender esse texto um pouco melhor. 
     Escrevo porque vários acontecimentos dos últimos meses me deixaram pensando nessa coisa da saudade. E tudo o que aconteceu fez com que eu me tornasse uma pessoa muito mais cética. 
     Hoje digo com certeza que não acredito mais em quem diz que está com saudades de mim. Não me venham com essa palavra, porque eu não compro mais. Comprava, achava linda, essa palavra só da nossa língua. Hoje já não sou mais assim. 
      Quando eu estava morando em outro país, muita gente, muita gente mesmo, vivia me escrevendo saudades. Uns contavam os dias (juro) pra eu voltar pro Brasil, diziam que tinham sonhado que eu tinha voltado (!).. bom.. diziam all kinds of crap. 

     Quando eu voltei pra casa demorou pouco tempo pra eu perceber que é muito mais fácil escrever que a gente sente falta de alguém do que de fato demonstrar isso com ações.       

     Finalmente eu estava aqui, e, de repente, a tão falada saudade deu lugar a um monte de gente muito ocupada com as atribuições do dia a dia pra se importar com qualquer outra coisa. 
      Cheguei a essa conclusão, depois de muito quebrar a cara esse ano (inclusive depois de ter ido morar no mesmo apartamento de uma pessoa que me dizia isso todos os dias). 
      Não acredito mais no 'tô com saudade'. Quem sente saudade não percebe que quando a pessoa tá longe é bem mais fácil lembrar só das coisas boas e legais. E não se dá conta que no dia a dia a história não é assim. Quando você percebe que tem que dividir a pia, a máquina de lavar, as contas, a vida fica um pouco mais complicada do que a amizade por Skype, né? Parece óbvio, mas pra mim não era, e eu tive que entender isso do pior jeito possível. 
      'A saudade é traiçoeira', que nem disse meu amigo Rod. Até nós mesmos não conseguimos nos lembrar de todos os sufocos que passamos nos EUA. Sentimos tanta falta de lá, que só lembramos da parte boa. E com as pessoas é a mesma coisa. 'É fácil amar alguém quando esse alguém tá longe', disse o Jeferson essa semana.
     Não sei se existe solução pra isso. Também não acredito que todas as pessoas dizem saudade levianamente - só acho que algumas falam sem pensar. De qualquer forma, acredito que antes de sair escrevendo 'saudade' pra deus e o mundo que estão longe, acho mais válido primeiro pensar um pouco se a gente tá dando a devida atenção pras pessoas que estão perto. 
     



O que inspirou esse post foi um outro texto, da minha amiga também jornalista, Grazi. Aqui o link do texto dela, que cita uma ótima poesia do Mario Quintana: “O sumo bem só no ideal perdura…/Ah! Quanta vez a vida nos revela /Que “a saudade da amada criatura” / É bem melhor do que a presença dela…”


terça-feira, 3 de setembro de 2013

Last looks e botas de neve

Sabe aquela cena de filme, onde a escritora encara fixamente a tela do computador, com a pagina em branco do Word e aquela barrinha piscando? E ela tenta, tenta, mas nao consegue escrever nada?

Entao. Minha tela em branco espera a resposta genial que devo ter nos proximos minutos explicando por que quero me mudar para a Africa. Parece ateh invencao, mas eh serio dessa vez.

Enquanto tento escrever, uma mulher de megafone grita, sem causar muita empolgacao no restante do pessoal que esta protestando por alguma causa perdida, como protestam todos os outros finais de tarde no centro de Porto Alegre. "Tarso a culpa eh tua, a culpa eh toda tua", ela canta. As buzinas (como adoram buzinar nessa cidade) demonstram que a galera que segue essa mulher ta causando (mais) trafego na pior hora do dia. Imagino o Tarso nesse momento, la dentro do Palacio, virando os olhos e pensando who gives a shit.

Lembro do homem da descida da Borges que vi mais cedo, sem os quatro dentes da frente, vendendo cigarros vindos diretamente do Paraguai a precos muito camaradas. Serio que alguem compra isso? Fumante eh foda. Fumante que fuma do Paraguai eh mais foda ainda.

Como mais um pedaco de bolo, que preparei no meu primeiro dia em casa. Fico, enquanto isso, tentando entender como numa semana estava feliz e radiante autografando materia de capa de revista pra uma amiga orgulhosa, e, na semana seguinte, estava em casa fazendo bolo as 3 da tarde de uma segunda feira vestindo pijama e botas de neve. Enquanto eu mexia o bolo, lembrava de todos os last looks que eu recebi (e que sei que ainda vou receber) nos proximos dias. Last looks, pra quem nao eh um fa de Tudo Acontece em Elizabethtown como eu, eh aquela cara de compaixao que as pessoas te fazem quando sabem que vai ser provavelmente a ultima vez que vao te ver. E eu achando que em 2012 tinha superado minha cota pra vida de last looks. (Horror looks, eh os que as pessoas te dao quando voce vai ateh o Zaffari vestindo pijama e bota de neve no meio da tarde, porque percebeu que falta leite pro bolo).

Tem que rir pra nao chorar. E bom... se tem uma coisa que esse 2013 (seu lindo. mentira.) me ensinou, eh aguentar as decepcoes e mudancas de planos. Rindo.

E vamos acender uma vela pra eu conseguir esse emprego na Africa.



Ps. Nada como um bom drama pra reativar um blog, neh?

segunda-feira, 8 de julho de 2013

E se você não estivesse lendo esse texto?

Vi um vídeo no TED em que o Steve Jobs fala que se ele não tivesse largado a faculdade tudo teria sido diferente na vida dele. E ele não teria feito uma aula de caligrafia, que, dez anos depois, ajudou ele a fazer o design do primeiro Mac.

Sempre viajei muito nessa história do 'e se'. É incrível a quantidade de hipóteses que surgem quando tu para pra pensar em quantas coisas seriam diferentes 'se' alguma coisa não tivesse acontecido.

Esse final de semana assistimos uns vídeos de 1993, que meus primos passaram pra DVD. Não sei a de vocês, mas um dos programas preferidos da minha família é reunir e ver vídeos antigos - bom, na verdade não sei se eles amam tanto assim, mas eu adoro. E sei que a minha irmã também, porque quando a gente era criança a gente quase furou a FITA do meu primeiro ano de idade, em 1988, de tanto que assistíamos, e olha que nessa época ela nem estava nos planos mais longínquos dos meus pais. Mas vendo esse vídeo, de quando a minha prima fez 1 ano de idade, ficava pensando como seria se alguém pudesse entrar naquele vídeo, uma coisa super de volta para o futuro, e avisar todas as pessoas sobre as coisas maravilhosas - e sobre as não tão maravilhosas assim  - que aconteceriam nos próximos 20 anos.

Já pensou? Uma pessoa chegando lá em 1993 e contando tudo?

- Tu vai ter mais um filho
- Vocês dois vão se separar
- Tu vai ser publicitário
- Tu vai atropelar uma árvore quando pegar o carro pela primeira vez com 14 anos
- Tu vai trabalhar com moda
- Teu filho vai rodar um ano na escola
- Tu vai quebrar o braço
- Tu vai ser atriz de teatro
- Tu vai operar o nariz
- Tu vai sofrer um acidente de carro horrível - mas vai ficar bem depois
- Tu vai ser demitido (mas vai se recuperar)
- O teu coração vai ser partido, mais de uma vez (mas vai se recuperar)
- Tu vai conseguir um emprego ótimo e vai ver que a preocupação não era necessária
- Teu carro vai ser roubado
- Tua firma vai te dar muito trabalho
- Tu vai ir pros Estados Unidos e viver o ano mais intenso de todos - e na volta vai afundar em a couple of months de muita tristeza (mas vai se recuperar)

E assim segue essa montanha russa de acontecimentos que fizeram todo mundo rir e chorar. Mas será que seria legal saber tudo isso antes de acontecer? Será que a gente faria as coisas diferentes se já soubesse isso? (eu, pelo menos, sei que não teria ligado aquele carro com 14 anos haha) Não sei.. sei, por exemplo, que nesse 'e se', se uma das minhas tias não tivesse se separado do namorado da época do vídeo, ela não teria casado com meu tio hoje e eles não teriam a bebê mais fofinha do mundo que eles têm.

..

Vimos um filme, eu, o Vag e a Babi, chamado Camille Outra vez, em que a protagonista francesa tinha justamente a chance de fazer isso, voltar uns 20 anos e poder fazer tudo diferente. Ela volta pra escola e conhece de novo o cara que ela vai se casar - e que vai botar chifres nela depois - e tem a chance de não ficar com ele de novo dessa vez. Só que.. bom, não vou contar o filme todo. Mas te faz pensar. Que nem diz aquele ensinamento indu, que tá colado no meu espelho do quarto, pra que eu possa ler todos os dias: que talvez as coisas aconteceram exatamente do jeito que deveriam ter acontecido - nada poderia ter sido diferente.






Eu e minha mãe, há exatos 20 anos, no vídeo. A gente não fazia ideia, hein?

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Brazil protests for a better country

People against the billions spent on the next World Cup are taking over the streets to ask for investments in what the country really needs






It all started on Facebook.

With the help of social media, students from Porto Alegre, in South Brazil, organized a serie of protests because of an increase in the price of the bus fare. Then, the same happened in São Paulo, the largest city in the country. The Brazilian police wasn’t nice with the protesters, and using tear gas, pepper spray and rubber bullets to disperse them, caused indignation in a lot of people.

Because of that, what has started as a complain because of the bus fare became something huge. People decided to take over the streets to protest against this violence. To protest for the right to protest. And there are reasons enough to protest in my country, believe me.

Monday, June 17, was a historic night for Brazil. People from 11 capitals took over the streets to ask for a serie of things. The biggest demonstration was in Rio de Janeiro, where 100,000 people marched. In Brasilia, the capital of the country, protesters breached security at the National Congress building and scaled the roof. The images of the protesters invading the Congress ran throughout the world.

The Congress probably represents everything is wrong in this country. Here, it’s quite normal to watch news about corruption and embezzlement. Our politicians gave themselves the benefit of receiving three extra months of salaries after December every year. These salaries are about R$ 17,000 a month (more than $ 2,000 a week). We can compare this amount with how much other professions make in my country: a professor, for example, makes R$ 800 a month (thats $100 a week).
Other reason for the protests is the high taxes we pay here. Each Brazilian needs to work around 150 days a year only to pay for taxes. We wouldn’t even care that much, if this money from taxes was actually invested in good things for the country, like health education, public transportation. It’s not.

And thats leads us to the main cause that is motivating these protests: The World Cup. The biggest event of soccer, which is going to happen in Brazil in 2014, is making my country spend R$ 28 bilions. We are building billionaires stadiums in a country where illiteracy reaches 21%, where 13 million of people don’t have what to eat everyday and where the majority of them depend on the health public system, which has severe problems - people here die waiting for an appointment with a doctor. The situation isn't funny, but became motivation for a joke: Several people are protesting with posters that say: “Next time your son gets sick, take him to a stadium”. 

In Brazil, there are no room for all the sick people on the hospitals, there are no room for all the kids on schools and kindergartens. We definitely didn’t need more stadiums. We need food, education, health.

Something is clearly wrong here and people are sick of it. This has became a lot bigger than an insatisfaction posted on social media. This is not only on Facebook anymore. People are taking over the streets. Finally. Last time that happened here - in the beginning of the 90’s, for the impeachment of a very corrupt president - I was too young to protest. Not this time. My friends and I were part of the 20,000 who were on the streets of Porto Alegre last Monday, and we are going to all the other protests that have been organized for the next days. 

Nobody knows how this is going to end. What we do know is that Brazilian people are tired of living in a country we are ashamed of. Now, it’s time to live in a country we helped to change.









segunda-feira, 15 de abril de 2013

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Pittsburg Rehab


"Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas próprias árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio teto. Um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser
Amyr Klink

...

"Para se ser feliz até um certo ponto é preciso ter-se sofrido até esse mesmo ponto."
Edgar Allan Poe

Três meses de volta ao Brasil - e ainda não está fácil se acostumar. Passei por dias tão tensos que um dia cheguei a dizer que gostaria de não ter feito essa viagem pros EUA, só pra não ter passado por essa fossa na volta, que já dura desde janeiro. Absurdo esse pensamento, eu sei, mas só pra dar uma dimensão da loucura que uma pessoa pode entrar quando passa por uma experiência dessas. A parte mais punk não é estar lá, é voltar. Você come o pão que o diabo amassou, sério.

Quando a gente volta a gente precisa aprender a ficar feliz com as coisas simples - até porque coisas espetaculares aqui é difícil. Mas me animar com coisas simples sempre foi muito difícil pra mim - já era antes de eu fazer intercâmbio. Agora, depois de ter viajado pra tanto lugar legal e ter conhecido tanta gente boa, é ainda mais desafiador. Vejo as pessoas se empolgando com um final de semana de folga, um domingo que faz sol, em vez de chuva, e penso.. é isso? Sério? Invejo muito, muito mesmo, pessoas que conseguem ser felizes com coisas do dia a dia. E almejo chegar lá. Um dia.

Eu parei de começar minhas frases com "lá nos Estados Unidos era...", porque saturei um pouco meus amigos, eu acho. Agora cada vez que esse pensamento vem na minha mente (umas 200 vezes por dia), eu guardo pra mim. Tipo quando passo numa calçada em Porto Alegre o varredor varre a sujeira nos meus pés, ou quando alguém esbarra em mim quando to no mercado, eu evito de comentar coisas do tipo "em Pittsburg esse varredor não apenas teria parado de varrer, como teria me dado 'bom dia, como você está hoje'?" ou "em Pittsburg ninguém teria esbarrado em mim no Walmart sem ter pedido desculpas e dado um sorriso".

Cada vez que a saudade bate (umas 300 vezes por dia) penso nas pessoas que eu convivi - e nas muitas que também eram estudantes internacionais e tiveram que voltar. E pra resolver esse problema enchi o meu quarto novo de fotos de todo mundo. Ver as fotos das pessoas e das viagens me ajuda, de alguma forma estranha, a seguir tentando me readaptar a minha vida aqui.

Ajuda saber que passei por tudo o que eu tinha que ter passado. Mas ainda assim é difícil. E já tentei muitas outras abordagens pra tentar me sentir melhor - correr (correr, correr, correr...), faxinar a casa, desabafar com ex-intercambistas, longas sessões de skype,  ir pra balada, ficar em casa durante dias, dormir sessões de 14 horas seguidas, assistir 10 episódios seguidos de Greys Anatomy, procurar QUALQUER outra forma de voltar aos EUA, tentar me inscrever até em programa pra jornalistas na Finlandia, ficar com desconhecidos (ok, essa é brincadeirinha ;), me mudar de cidade, etc etc, a lista de atividades segue longa - e ineficiente.

Se alguém tem alguma ideia de onde fica Pittsburg rehab, por favor me avise, porque certamente, esse lugar não é aqui.


"Pittsburg didn't exist. It was just a dream we had"

quinta-feira, 21 de março de 2013

Vai passar

Existem 5 fases do luto - todos sabem. Se você não sabe isso é porque você é muito feliz,então saia desse blog. 

O grande equívoco é que as pessoas costumam achar que essas fases aplicam-se apenas a mortes de pessoas. Mas não é. Passamos pelas fases do luto também em finais de relacionamentos ou finais de importantes etapas de nossas vidas.


Só abro esses assuntos aqui, porque sei a quantidade de gente que passou pela mesma fossa dos dois acontecimentos citados acima (leia os sublinhados novamente). Incrível a identificação das pessoas - e como vivemos todos os mesmos tipos de problemas. Quando escrevi sobre o Paulo, o mentiroso, recebi muitas mensagens de outras gurias que também tiveram esse calvário em suas jovens vidas, e eu não fazia ideia que o problema era tão comum. Paulo, se você continua leitor desse blog (eu sei que você é), saiba que você também não está sozinho - há muitos do seu clube causando estragos por aí. Cheers. 





















Mas voltando às fases do luto: negação, raiva, depressão, aceitação e motivação. 


Então se você está na pior, e antes que comece a desenvolver doenças psicossomáticas, pense que você tem todas essas fases pra passar. Mesmo se você não viu ninguém morrer (literalmente) você vai ter que passar por isso. E você vai passar, e vai ser uma merda. Mas uma hora vai acabar. Ignore os amigos que vão ficar martelando o "vai passar". 

Você sabe, lá no fundo, que vai, mas você não precisa de uma pessoa dizendo isso over and over again. No seu tempo, vai passar. Com o tempo, o pensamento "que merda, essa não é a minha vida!" não vai mais ser a primeira coisa que surgirá na sua cabeça de manhã (vai ser a segunda). 

E já que esse blog virou de auto-ajuda mesmo, aqui vão premissas muito importantes selecionadas por mim e minha amiga Bruna Tessari, para fazer a sua vida mais feliz (ou menos trágica).


Lembre-se sempre:
  • Quanto maior a subida, maior a queda. Tenha noção disso, que a queda vai doer menos.
  • Fique atento aos sinais - os sinais são sagrados, é pecado ignorá-los.
  • Nunca invista numa pessoa que não se esforça. 
  • Nada está tão ruim que não possa piorar (mantra). 
  • Mantenha-se sempre com um pé atrás. Os dois na frente dá merda - os dois atrás você não consegue se envolver com nada. Um atrás é o ideal.
  • Depois de um tempo você passa a agradecer o que a pessoa fez por você (essas, nós dedicamos aos nossos ex). 
  • Você vai achar que nunca mais vai rir na vida. E vai passar vários dias querendo matar pessoas que estão sendo felizes e dando risada. Mas depois dessas fases você vai conseguir rir - e vai rir inclusive do que aconteceu com você. 
  • Acredite naquela frase ridícula "não era pra ser". Uma vez eu chorei um dia e uma noite por não ter sido selecionada pra um intercâmbio na Florida, onde eu ia trabalhar num hotel. Se isso não tivesse acontecido, eu não teria ido atrás de outro intercâmbio e não teria acabado na adorável Pittsburg. Então, não era pra ser. "When you stop chasing the wrong things you give the right things a chance to catch you".
  • Você acha que não vai se recuperar - talvez você nunca mais seja a mesma pessoa, mas você vai se recuperar, vai mesmo. E você vai sambar na cara daquela situação.
  • Algumas pessoas precisam acordar pra vida. Se você acha que é uma dessas pessoas: acorde pra vida.

quarta-feira, 13 de março de 2013

Pega essa bola, Argentina

Direto da Redação:

antes:


_ Tá saindo fumaça! É churrasco! O papa é gaúcho!


_ Ucho ucho ucho, o papa é gaúcho.


_ Meu celular tá tocando? Deve ser o Odilo, dizendo "SOU EU"


_ "Esse papa sou eu", ele vai dizer


_ Se esse papa for gaúcho eu me mudo de cidade.


_ Vai ter sucursal no Vaticano?


_ Vamos ter de aprender Latim! E italiano.



durante:


_quem que é esse?


_quem é quem é?


_não dá pra ver, ele é muito pequeno!!


_ ESSE É SÓ O CARA QUE VAI ANUNCIAR!



depois:


_O PAPA É ARGENTINO?!


_BEM FEITO PRA ELES!


_A manchete vai ser Puta que o pariu, o papa é argentino.


_Ahhhhh ele tem carinha de querido.


terça-feira, 12 de março de 2013

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

The night that Brazil wants to forget

Val Vita

Brazil cried the loss of 233 lives in the morning of Sunday, January 27. A fire in a crowded night club, named Kiss, in Santa Maria, Southern Brazil, was considered the biggest tragedy in the history of the state – and the second worst tragedy caused by fire in the country. Besides the deaths, more than 120 people are injured.

The police is still investigating what really happened – but survivors told that the cause was a pyrotechnics show performed by a local band. About 2,000 people were inside the club at the time of the accident – the capacity was 1,000. There was only one way out of the club – and 90% of the bodies, police said, was found in the restrooms. Because of the lack of signalization  and the thick smoke caused by the fire, people thought the restrooms were the exit.

The majority of the night clubs in my state, Rio Grande do Sul, where Santa Maria is located, is closed during this week. Parties, concerts, soccer games and all kinds of events were cancelled because of what happened. No parties this week in respect of all the victims and their families.

A few days after the tragedy, people from my state still can’t accept what happened. Santa Maria, like Pittsburg, is a college town, so the majority of the victims is students. Young people who entered the club to have fun and never left it. In that sad Sunday morning, many Brazilians, including me, couldn't avoid the tears while watching the news. All the channels were showing images of the club, destroyed by the fire, or the gymnasium of the town, where the 233 bodies were taken to be identified by the families and friends.

One story, told by a Brazilian journalist, made even the toughest ones cry a little bit. The journalist said he was talking to one of the firefighters who helped after the tragedy. The firefighter found a cellphone ringing incessantly with one of the victims – a girl, who was already dead. On the screen of the phone it said: 104 missed calls – mom.

While hundreds of moms, dads and friends try to understand what happened, the police continue the investigations (four people were already arrested – two owners of the night club and two members of the band). All the clubs in the state are being verified, so a tragedy like this never be repeated.   

(From: The Collegio)

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Noites acordadas numa cidade que cheira a maconha

A insonia voltou. Of course it did. La fora, na Marechal Floriano Peixoto, um novo carro passa tocando funk no volume maximo. Tao maximo que entra nos meus sonhos e me traz de volta pra esse mundo real.

Wtf am I doing back to this country?

Uma moto acelera muito alto. E as pessoas gritam, meu deus, como pode ter tanta gente ali embaixo? Escuto o que parece ser um tiro. O aglomerado de vozes continua. Eh muita. muita gente. Juro que essas devem ser as saidas de baile funk mais barulhentas de Porto Alegre. Se tem gente que aguenta pior que isso merece premio.

Na cama do lado, o Eri dorme como se fosse imune a toda essa confusao. Todos do apartamento dormem. Sempre invejei pessoas de sono pesado.

Tento tomar agua direto da garrafa de dois litros. A agua esta quente. O ventilador luta pra refrescar o quarto. Nem esta tao quente. Dias piores fizeram em Dezembro, dizem.

Sao 5 da manha. Muito cedo em Caxias, muio tarde em Pittsburg. Abrir o Facebook pra conversar eh useless. Radialistas de Caxias que acordam cedo, eita profissao, fazem questao de postar ja a essa hora que o final de semana foi violento no Rio Grande do Sul - 25 homicidios e a tragica noticia de que um bebe foi encontrado no lixo em Caxias.

Na minha cabeca a maldita 'Vodka ou agua de coco', pelo o que deve ser a decima vez no final de semana, comeca a tocar. Quem eh Naldo e porque essa musica grudou na minha cabeca dessa forma?

Tudo comecou quando eu assisti o programa da Regina Case no domingo de tarde. Foi aih que eu vi o Naldo pela primeira vez. Que tristeza.

Regina entrevista o secretario de seguranca do Rio. Ele faz cara de quem obviamente nao queria estar la, admitindo o quanto a cidade ainda tem problemas mesmo depois da pacificacao.

Regina entrevista moradores na plateia: "Voce foi vitima da violencia", ela afirma, ao inves de perguntar, a uma mulher. A entrevistada chora e conta da "bala achada, e nao perdida, que acertou a irma dela na cabeca enquanto as duas estavam na cozinha da casa". O secretario recebe close e faz cara de paisagem.

A proxima materia vai mostrar gurias da favela de vestido longo e rodado realizando o sonho de debutar. Foi na frente da TV que eu soltei sem querer um "Eu nao gosto desse pais."

Durante a noite de ontem decidi assistir ao filme da Frida Kahlo, pra distrair. Frida morre (spoiler que voce ja deveria saber, claro). Antes de morrer, uma de suas frases grudou na minha cabeca: "Espero alegremente a saída - e espero nunca mais voltar."

La fora, finalmente o barulho na Marechal Floriano cessa. O povo que ha poucos minutos gritava e acelerava foi pra casa. Como essa gente trabalha na manha de segunda?

Porto Alegre esta feia. Suja.

A cada esquina um mendigo desmaiado num colchao velho, dormindo com as meias encardidas e furadas a mostra.  O cara que fez nosso cachorro-quente na Republica nao lavou as maos. Nem usou luva.

A cidade cheira mal. As ruas mais antigas cheiram a xixi. A Redencao cheira a maconha barata. A multidao de artistas que ensaiava para um bloco de carnaval na tardezinha de domingo parecia muito feliz - feliz como se fosse alheia aos problemas do mundo. E alheia a aquele cheiro.

Me disseram que na volta pro Brasil ateh os cheiros iam ser diferentes. Nao acreditei. Estava errada. A cada quadra eh um cheiro diferente, que os outros nao percebem. Ou nao se incomodam.

Como a cidade pode ter mudado tanto em um ano? Sim, eu sei. Nao mudou.

Tento ouvir meu Barulho de Chuva e Sons da Noite, baixado no meu celular, mas o telefone esta quase morrendo. Enquanto o celular carregava decidi escrever esse texto. Pronto. Achei um proposito pra esse blog de titulo obsoleto que todos os meus amigos diziam pra eu deletar. Vou continuar escrevendo. Substitui, forcadamente, os textos de Conheca os Estados Unidos, por Conheca o nosso Brasil - e tente viver nele. Um texto por insonia.

(Prometo que vou configurar o teclado para Portugues  pra voltar a dar aos pobres leitores um texto digno, com acentos e crases)

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Voltando pra casa

Voltar pra casa depois de um intercambio eh uma experiencia punk. Voce acha que vai passar por varias coisas -  da euforia total ao abismo da depressao - mas no meu caso, por enquanto, a única fase que eu tenho vivido eh a da ‘cara de paisagem’. Talvez seja precipitado para escrever um texto assim, ja que to no Brasil ha apenas 10 dias. Mas a sensacao que eu tenho eh que ninguem consegue, e nem vai conseguir, entender tudo o que aconteceu e qual a sensacao de voltar para casa depois de tudo isso. Por isso eu aderi a cara de paisagem.

Ateh agora uma das minhas conversas mais úteis foi com o Jeferson, que me fez entender algo que eu estava tentando ha dias. Ele disse que leu um negocio sobre uma psicóloga especializada em depressao pos viagem (nao que eu esteja na depressao, muito pelo contrario, to ate umas dez vezes mais feliz do que eu era quando sai de Caxias). Mas entao, essa psicóloga dizia que o maior motivo pras pessoas ficarem tristes quando voltam de uma viagem dessas eh que as pessoas nao fazem pergunta alguma. Elas nao estao nem aih, nao querem saber. E eh isso o que eh difícil de aceitar sabe, quem passa um ano fora, que nem eu, ou um mes, que seja, como foi o caso do Jeferson, viveu muita coisa legal. Mas isso nao faz diferencia na vida das outras pessoas. E eh isso o que eu nao tinha entendido – e que agora to comecando a aceitar. Porque realmente, nao eh da obrigacao de ninguem se importar. Para mim, o que perguntam eh: “E o teu namorado?!”, ou entao “Tu ja tem um emprego em vista agora?”. Cara de paisagem para as duas perguntas.

Tudo melhora com o passar dos dias, isso eu aprendi. Nos primeiros eu achei que ia pirar sem estar em Pittsburg. E o panico comecou quando eu tava ainda no aeroporto de Nova Iorque, no inicio do mes. A questao eh que saimos de NY. NYC, o recinto da clase media alta brasileira, que passou as ferias enchendo o c* de compras na Times Square.

Eu, a Natalia e o Fabio estavamos bem tranquilos esperando no saguao do aeroporto, ateh que deu a hora do embarque. Foi a partir do portao de embarque que dava a Sao Paulo que o choque cultural – que nao eh um mito – comecou. Foi assim, instantaneo. No momento que cruzamos aquela porta, ninguem mais falava ingles. Era gente reclamando, crianca e pre adolescente brigando com os pais… O povo vestindo aquelas camisetas I <3 NY, as mulheres de salto alto, relogio dourado, exibindo aqueles cabeloes com reflexos, aquela coisa bem brega, que soh brasileira mesmo para achar que esta causando. E as pessoas nao paravam de falar!

Comecei a olhar pras saidas, nao to brincando, me deu calor, queria ir embora dali, voltar para calmaria do Kansas, onde todo mundo era amavel – e onde nos eramos os estudantes brasileiros de intercambio em Pittsburg – a partir daquele portao de embarque nos eramos apenas mais tres brasileiros naquela massa consumista que tava embarcando de volta para casa carregada de compras.

Quando entrei no aviao eu finalmente colapsed, como se diz. Acho que foi soh nesse momento que eu percebi que tinha acabado meu ano lindo (Meu ‘Comer, Rezar e Amar’, como eu costumo dizer – soh que sem a parte do rezar). Dai eu comecei a chorar. Muito. Aquelas lagrimas que saem com tanta forca que nao escorrem pelo rosto, mas jorram para frente, tipo chafariz. Cada vez que o piloto repetia ‘esse eh o voo tal, com destino a Sao Paulo’ eu chorava mais ainda. Nao tava nem aih pro aviao lotado, nao conhecia ninguem mesmo. Mas acho que a mulher do meu lado ficou preocupada e teve uma hora que ela finalmente perguntou: ‘tah tudo bem?’.

Parei de chorar mesmo mesmo quando cheguei no Brasil de manha. Quando pisei no aeroporto abafado de Guarulhos eu decidi que tava na hora de ficar feliz por estar indo para casa, encontrar meus pais depois de um ano. E foi sorrindo que eu disse ate bom dia prum cara do aeroporto, e tudo o que me respondeu de volta foi:

“TAH VINDO DAONDE?”
“Nova Iorque”
“AH, ENTAO PASSA AQUI NESSE CORREDOR”

De todo aquele povo cheio de compras, eu fui uma das paradas na alfandega. Logico. Passaram minhas malas no Raio X, e como la nao tinha nada, alem das minhas roupas e muitos moletons da universidade que eu comprei pra mim, me liberaram. 

Mas nem isso tirou meu sorriso. Cheguei no guiche da Gol e de novo insisti: “BOM DIA”. A mulher pegou meu passaporte e nao me respondeu. Foi ese o meu bem vinda ao Brasil. No voo da Gol de SP a Porto Alegre nao tinha comida, tinha que comprar - em reais, apenas. Soh tinhamos dolares. Ficamos sem comer. Obrigada, Gol, por pensar sempre nas pessoas que voltam de fora. 

Os dias melhoraram significavelmente depois disso. Foi bom voltar para casa, foi mesmo. E foi maravilhosa a ideia da minha mae em me levar passar uma semana em um lugar onde ninguem falava portugues: Canasvieiras, Florianopolis. Uma semana no sol e no mar, cercada de gente falando espanhol. 

Foi la que eu comecei a acreditar que tudo o que eu tinha que ter vivido em Pittsburg eu vivi. Sinto saudades diarias de pessoas que conviviam comigo, mas penso que ao inves de ficar triste eh mais facil ficar feliz por ter tido todas elas na minha vida, presentes todos os dias, por pelo menos um ano. 

Enquanto vou me desapegando da minha antiga vida, vou me acostumando com a minha nova. A Renata ajudou bastante, com seu tratamento de choque escrevendo sempre em Caps, MEU, TUA VIDA EH AQUI. 

Mais uma vez, nao faco ideia do que vai acontecer. Mas ja me vi nessa situacao tantas vezes nos últimos anos.. Prefiro, entao, acreditar que o melhor ainda esta por vir ;)

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

New Year’s Eve na Times Square – a experiência

Aviso: por mais exagerada que possa parecer a descrição dos fatos, eu juro que foi exatamente assim que aconteceu.

     Existem algumas coisas nessa vida que você deve fazer apenas uma vez. Para mim, uma dessas coisas foi ter viajado de ônibus nos Estados Unidos. Atravessei cinco estados inteirinhos com um ônibus pinga pinga que parou em 80% das cidades desses estados. Em grande parte dessas paradas eu era obrigada a descer do ônibus e pegar as malas, para embarcar em outro ônibus. Do Kansas (onde eu estava morando) até Nova Iorque (onde eu passaria o Natal e Ano Novo de 2012/2013), a viagem levou 37 horas. Depois de uma experiência dessas, você pensa que já teve sua cota de indiada por pelo menos um ano. Só que não. Porque vocês e seus amigos decidem passar o Reveillon na Times Square. Vocês e mais muitos milhões de pessoas.
     Nós e mais esses milhões de turistas estávamos empolgadíssimos com a ideia de ver a bola cair na Times Square. Mas ver a bola cair, meus caros, não foi nada como a gente imaginou. A gente foi ingênuo também. Todo mundo nos dizia 'you guys are crazy'. E, por algum motivo, a gente não os escutava. Primeiro aprendizado: quando alguém disser 'vocês são loucos', acredite. Não tente ir contra o que as pessoas estão te recomendando. Elas sabem do que elas estão falando.
     Então, contrariando a todos, colocamos grande parte das roupas de inverno (porque estava muito, muito frio) e fomos até a Times Square às 17h do dia 31 de dezembro de 2012. Cinco da tarde pareceu um horário razoável _ não eram 14h, hora em que as pessoas lunáticas chegam pra ficar quase na grade, mas também era um horário suficientemente bom pra pegar um bom lugar. Só que não era.
     Quando a gente chegou lá, a cena era de Titanic, naquela hora que eles fecham as portas das terceira classe para a terceira classe não subir no barco e se salvar. Todas as ruas que davam na Times Square estavam fechadas. E os policiais gritando: move ooon, move ooon guys. Dai a multidão ía. Chegamos até a Rua número 52, onde disseram que dava pra entrar. Tinha muita gente naquela entrada, gente que eu não conseguiria nem dimensionar. E tinha uma fila para entrar na rua. Nesse momento, começamos a ser brasileiros (mesmo que entre os meus amigos havia um alemão e um espanhol). Nos metemos no começo da fila e entramos, fingindo não entender inglês, quando a galera começou a gritar "There is a lineee, is a liiineeeeee". Eu sei, horrível, mas vocês tem que entender que a gente queria muito ver aquela bola.
     Só que o universo nos castigou por ter furado a fila, e, quando os policiais tiraram uns cavaletes na esquina e a gente pode entrar, toda a galera de trás começou a empurrar. Mas não empurrar estilo Planeta Atlântida ou carnaval do Rio. Empurrar como se estivessem lutando pelas suas vidas. Não tinha nem como sair de lá. Não tinha como desmaiar também. Se eu morresse lá, meu corpo teria sido levado pela multidão. Era japa, era indu, era brasileiro, paraguaio, italiano, era gente com mala, gente com caixa de pizza... Depois que passou a parte da empurração, chegamos no lugares determinado pelos policiais. Só que era horrível! Não apenas não víamos a bola, como não víamos nem o prédio onde ela estava. E, contrariando nossas expectativas, não tinha telões! Nosso instinto de 'vamos ver essa bola de qualquer jeito' falou mais alto. Fizemos um plano de pular a cerca quando nenhum policial estivesse olhando, para entrar em um Mc Donalds na esquina, atravessá-lo e chegar em um outro bloco. Conseguimos. Não sem antes passar pelo momento 'sardinha entalada' número dois. Naquela hora eu fui tão empurrada que fui jogada, literalmente, em cima de uns cavaletes. 
     Com isso, deixamos uma galera pra trás. Conseguimos um lugar muito melhor, onde víamos tudo, estávamos na rua 50, há uns nove blocos do prédio onde tudo ia acontecer. Tivemos uns breves minutos de felicidade e sentimento de vitória. Até nos abraçamos.
     Só que a felicidade durou pouco e o frio começou a bater. Demais. Estava zero grau, não estava nem negativo, mas tinha um vento que castigava. E tínhamos de ficar parados por sete horas. Tentamos sentar no chão, um encostando as costas no outro, para nos apoiarmos, e fizemos uma pirâmide humana de calor. Botei uma caixa vazia de Pizza Hut no chão pra não gelar a minha bunda. Aguentamos por duas horas que pareceram meses. Estávamos o retrato da dor, teve gente que até tirava foto de nos, oito amigos, tremendo juntos. Eu tentava escrever mensagens de Feliz Ano Novo no meu cel pra mandar pra uns amigos e não conseguia mexer os dedos. 
     Nada está tão ruim que não possa piorar e, nessa hora, todo mundo começou a ter muita vontade de fazer xixi. Porque fome e sede dá para aguentar, mas sete horas sem fazer xixi é muito desafiador. Ainda mais no frio. Você tem que preparar o corpo _ só tínhamos tomado um pouco de água no almoço e nada mais depois _ e o psicológico _ repetindo 'eu não estou com vontade de fazer xixi, eu posso aguentar até depois da meia noite'. Só que não adiantou. O problema não era que não dava pra sair do espaço para ir ao banheiro. O problema era que NÃO TINHA banheiro. Dá para acreditar? O maior réveillon do mundo e não tem banheiro químico? Nessa hora eu comecei a entender o que uma amiga tinha me falado, que algumas pessoas usam fralda pra ir na Times Square. Eu não tinha acreditado. 
     Conseguimos, depois de muitos 'nãos', um restaurante que nos deixou usar o banheiro. Depois disso, tudo pareceu menos sofrido. E já eram quase 23h. Tínhamos aguentado já seis horas de frio. Então finalmente entramos no clima de réveillon na Times Square. Aguentamos mais uma hora tremendo, quando teve os shows do Psy e da Taylor Swift, mas não conseguimos ouvir nada porque a Times Square não tem caixas de som. Só escuta quem esta no primeiro bloco. Eu penso em milhões e milhões de pessoas perto de nos e atrás de nos que saíram frustradas de lá, achando que iam para 'a balada' do ano, quando, na verdade, ficaram no maior silêncio a noite toda.
     A única parte realmente boa foi a contagem regressiva, que começou no um minuto. Dai todo mundo gritou muito. Quando deu meia noite, a bola desceu, mas foi super rápido, e ela desce a apaga, e todo mundo (incluindo os brasileiros atrás de nos) falaram: "é isso?". Teve uns fogos de artifício, mas nada do que achávamos. Foram tipo 20 segundos de fogos. E acabou. Até em Arroio do Sal eu vi mais fogos, gente. Até em Caxias, onde eu moro, eu vi mais fogos.
     A gente passou horas de frio, xingamentos, privação de necessidades básicas, e não valeu à pena. Valeu só por duas coisas: para poder escrever esse texto e deixar dito que passar o réveillon na Times Square é uma péssima ideia para o seu final do ano; e para poder contar pros meus filhos e netos que, quando eu tinha 25 anos, eu e mais sete amigos sofremos o calvário para poucos segundos de emoção. Nos tiraram comida, bebida, espaço pessoal e banheiro. Mas essa história, pelo menos, ninguém nunca vai poder nos tirar.